A arte africana
está fortemente ligada aos costumes tribais. Reflete sua consciência de mundo e
sua religiosidade, o espírito de seu povo. A partir de materiais como pedra,
madeira, ossos, couro, marfim, ferro e bronze, o artista retratava a vida e os
valores de sua tribo.
Essa relação da
vida com as manifestações artísticas, com as formas de comunicar, foi
desestruturada graças às incursões europeias em busca de escravos, o que
alterou irreversivelmente a estrutura social nativa. O crescimento do comércio
de escravos, que perdurou por séculos, provocou guerras contínuas entre Estados
Africanos do litoral, que abasteciam os europeus, e as tribos do interior. A
constante troca de produtos manufaturados por escravos causou a decadência do
artesanato negro-africano. Entre mortos na caçada de escravos e na viagem dos
navios negreiros, a África perdeu de 50 a 200 milhões de habitantes, em menos
de quatro séculos.
Pouco se sabe
sobre a escultura em madeira na África negra, provavelmente por este material
ser tão facilmente perecível, entretanto algumas esculturas em terracota,
encontradas em Nok, centro da mais antiga tradição da escultura africana,
parecem indicar uma influência da escultura em madeira, mais antiga, pois que,
a argila sugere uma técnica aditiva e as peças encontradas exibiam a técnica
inversa (vai-se desbastando blocos), usada normalmente para se esculpir em
madeira.
Algumas
características das esculturas de Nok, nordeste da Nigéria, parecem ter
influenciado largamente a arte africana até os dias de hoje. Cabeças
cilíndricas, grandes em proporção às pernas pequenas, detalhes do vestuário e
de penteados, a forma dos olhos e dos lábios salientes. Como em Ifé, outro
centro de tradição escultórica africana, percebe-se um esforço por atingir as
proporções naturais do corpo humano, em contraponto a uma forte tendência
estilizante na representação do rosto humano, onde os olhos e os lábios se
projetam protuberantes. Isto talvez esteja ligado a questões rituais de quem
acredita que retratar é aprisionar, dominar.
A arqueologia
não pode explicar a origem e a difusão da metalurgia na África, uma vez que
parece haver uma lacuna entre a Idade da Pedra e a Idade do Ferro. O certo é
que nos primeiros séculos da nossa era a metalurgia já era difundida em todo
continente africano. Assim, os africanos que vieram para a América como
escravos já se encontravam bastante desenvolvidos e, embora não conhecessem a
rodo, dominavam a metalurgia e a arte da cerâmica.
Os que vieram
para o Brasil pertenciam a dois grupos principais: Os bantos que vinha do sul
da África, principalmente de Angola, geralmente eram levados para Pernambuco e
Rio de Janeiro; os Sudaneses, que vinham principalmente da Costa do Marfim, em
sua maioria desembarcavam na Bahia.
Sua presença
contribuiu decisivamente para que a arte brasileira assumisse características
próprias e no Barroco brasileiro já se percebem sua influência nos anjos
mulatos e madonas negras pintados nas paredes das “igrejas dos brancos”. Como
na África, a arte negra no Brasil está intimamente ligada à idéia da sua
cultura, de seu cotidiano e de seu culto religioso, extremamente iconográfica.
Estatuária Ibeji
Um bom exemplo
da arte afro-brasileira podem ser as imagens de Cosme e Damião, que na Europa
se tratavam de dois médicos, e que não foram representados juntos senão no
Brasil, onde em geral são afixados sobre o mesmo pedestal, tomando a forma de
dois irmãos gêmeos, tal qual os Ibeji
(gêmeos) do culto africano. Pode-se falar ainda de imagens cujo sexo faz menção
à fecundidade na estatuária africana, recobertos por vertes esculpidas ou de
tecidos e brocados.
Ibeji (Ìbejì
ou Ìgbejì) - é o Orixá protetor dos
gêmeos na Mitologia Yoruba. Conhecido na Umbanda como Cosme e Damião e,
erradamente identificado nos Candomblés como Erês, Ibeji é na realidade a
divindade gêmea da vida - uma dualidade de existência que proporciona aos seus
filhos certas vantagens em relação aos demais orixás. Esses santos católicos
são comparados aos ibejis, gêmeos
amigos das crianças que teriam a capacidade de agilizar qualquer pedido que
lhes fosse feito em troca de doces e guloseimas. O nome Cosme significa "o
enfeitado" e Damião, "o popular". Essa associação entre
divindades se dá através do sincretismo religioso.
A grande
cerimônia dedicada a estes orixás acontece a 27 de setembro, dia de Cosme e
Damião, quando comidas como caruru, vatapá, bolinhos, doces, balas (associadas
às crianças, portanto) são oferecidas tanto aos orixás como aos frequentadores
dos terreiros. Essa data é celebrada também pelo Candomblé, Batuque, Xangô do
Nordeste, Xambá e pelos centros de Umbanda. Estas religiões celebram esse dia,
enfeitando seus templos com bandeirolas e alegres desenhos, tendo-se o costume
de dar às crianças doces e brinquedos.
Os símbolos
associados a esses orixás são: dois bonecos gêmeos, duas cabacinhas e brinquedos.
Cada gêmeo é
representado por uma imagem. Os Yorubá colocam alimentos sobre suas imagens
para invocar a benevolência de Ibeji. Os pais de gêmeos costumam fazer
sacrifícios a cada oito dias em honra ao Orixá.
Entre os deuses
africanos, gêmeos é o que indica a contradição, os opostos que caminham juntos
a dualidade de todo o ser humano, mostrando que todas as coisas, em todas as
circunstâncias, tem dois lados e que a justiça só pode ser feita se as duas
medidas forem pesadas, se os dois lados forem ouvidos.
Oxês de Xangô
Na arte
afro-brasileira predominam as esculturas em duas dimensões, talvez por questões
de ordem econômica, embora também na África se encontrassem esculturas
bidimensionais na representação dos símbolos (ferramentas) dos orixás (deuses e
entidades), como por exemplo, o Oxê de
Xangô.
Oxê
é o símbolo principal do orixá Xangô. É a machada de dois gumes ou dupla. Tudo
que se refere a estudos, as demandas judiciais, ao direito, contratos,
documentos trancados, pertencem aos seus domínios.
Divindade do
fogo e do trovão e da justiça e Rei de Oyó. Tem grande importância nos
segmentos do candomblé com origem em terras Yorubá, importância esta
representada pelo seu instrumento sagrado.
Xangô é um
Orixá temido e respeitado, é viril e violento, porém justiceiro, e muito
vaidoso. Xangô era muito atrevido e violento, porém, grande justiceiro, sempre
castigando os ladrões e malfeitores. Por este motivo diz-se que quem teve morte
por raio, ou sua casa, ou negócio queimado pelo fogo, foi vítima da ira ou
cólera de Xangô.
Estatuária de Exu
A estatuária de
Exu tem representações extremamente
diversificadas. Ainda na África, duas maneiras de representação são usadas. A
primeira trata-se de um monte de barro com uma pequena abertura, que era
geralmente colocado à frente das casas. A outra era uma imagem, geralmente
esculpida em madeira, de joelhos, braços colados ao corpo, masculina e
feminina, que carregava nas mãos duas pequenas cabaças e era guarnecida de uma
longa cabeleira recurvada em gancho, usada para pendurar a imagem nos ombros
dos religiosos durante o culto.No Brasil, esta
imagem sofre profundas modificações: a cabeleira torna-se vertical e tende a
bifurcar-se em dois chifres, mantendo-se a ideia de curvatura numa cauda, que
seria acrescida à imagem; as cabaças são substituídas por tridentes carregados
por braços já afastados do corpo, que assume uma nova postura, em pé. Assim, a
figura de Exu vai assumindo a forma do diabo católico o que poderia demonstrar
uma forma sutil de revolta contra a proibição do culto africano.
Exu é o orixá
da comunicação, é o mensageiro dos orixás. É o guardião das aldeias, cidades,
casas e do axé, das coisas que são feitas e do comportamento humano. Segundo a
tradição das religiões de matrizes africanas, ele é quem deve receber as
oferendas em primeiro lugar a fim de assegurar que tudo corra bem e de garantir
que sua função de mensageiro entre o Orun e o Aiye, mundo material e
espiritual, seja plenamente realizada.
No Brasil, na
época das colonizações Exu foi sincretizado erroneamente com o diabo cristão
pelos colonizadores, devido ao seu estilo irreverente, brincalhão e a forma
como é representado no culto africano, um falo humano ereto, simbolizando a fertilidade.
Por ser
provocador, indecente, astucioso e sensual é comumente confundido com a figura
de Satanás, o que é um absurdo dentro da construção teológica yorubá, posto que
não está em oposição a Deus, muito menos é considerada uma personificação do Mal.
Mesmo porque
nessa religião não existem diabos ou mesmo entidades encarregadas única e
exclusivamente por coisas ruins como faz as religiões cristãs, estas pregam que
tudo o que acontece de errado é culpa de um único ser que foi expulso, pelo
contrário na mitologia yoruba, bem como no candomblé cada uma das entidades
(Orixás) tem sua porção positiva e negativa assim como nós mesmos.
A segunda-feira
é o dia da semana consagrado a Exu. Suas cores são o vermelho e o preto; seu
símbolo é o ogó (bastão com cabaças que representa o falo); suas contas e
cores são o preto e o vermelho; as oferendas são bodes e galos, pretos de
preferência, e aguardente, acompanhado de comidas feitas no azeite de dendê.
Exú pode ser o mais benevolente dos Orixás se é tratado com consideração e
generosidade.
Considerações finais
A
bidimensionalidade das esculturas afro-brasileiras parece mesmo uma forma de
buscar sua identidade étnica, de diferenciar sua cultura, já que tantos objetos
de uso cotidiano se revestem de caráter simbólico.
As esculturas
afro-brasileiras trazem ainda muitas características vindas da África, como a
posição tradicional de joelhos numa figura perfeitamente equilibrada em torno
de um eixo, ou os olhos salientes. Mas já aparecem influências da estética
branca. Por exemplo, nos traços fisionômicos, no nariz e na boca, na forma dos
seios e no formato da cabeça já mais proporcional em relação ao corpo.
Como afirmou-se
no início, a Arte Negra reflete o espírito de um povo. Um povo que não conhecia
a roda, mas que usava da siderurgia com habilidade e que dominava a cerâmica e
o metal, que fazia arte. O espírito de um povo que, uma vez cativo, buscou
manter sua cultura e sua crença usando de artifícios de toda espécie, lutando
por sua integridade mesmo atado ao tronco.
É difícil dizer
onde e o que é a Arte Afro-Brasileira. Por certo não é somente a arte feita por
negros no território brasileiro. Iorubás,
Bantus, Nagôs, estão no Brasil misturados a Índios, Europeus, Asiáticos,
entre outros. São parte de nossa cultura, são parte de nós, são parte de nossa
arte. A Arte Afro-Brasileira está em toda parte, permeia os templos de umbanda,
já miscigenada, com as culturas europeia e indígena. Passeia também pelas
igrejas barrocas e por toda a arte feita no Brasil, já que estamos todos lado a
lado, partilhando de espaços, culturas e crenças que se misturam.
Não temos mais
uma arte Afro-Brasileira, Luso-Brasileira, Asio-Brasileira,
Nativo-Brasileira... Temos uma arte cheia de faces, de cores, rica em sua
cultura miscigenada. Temos uma ARTE BRASILEIRA.
Nenhum comentário:
Postar um comentário